sexta-feira, 27 de março de 2009

um artigo publicado pelos pesquisador...

Um artigo publicado pelos pesquisadores Luiz Antonio Ferreira da Silva (UFAL, Doutor em Genética pela UFRJ/) e Geraldo de Majella Historiador e Ouvidor Geral do Estado de Alagoas.

O DNA e os desaparecidos


A história recente de Alagoas tem evidenciado que o sucateamento do Estado, na área da segurança pública, vem favorecendo a pratica de crimes, sobretudo, o crime contra a vida. Na última década grande número de homicídios foi praticado no estado, poucos foram elucidados. Muitos desses crimes entraram para a lista dos crimes chamados "insolúveis". Mas não há crime insolúvel, o que existe de concreto é a incapacidade do aparelho estatal, por falta de recursos materiais e/ou humanos para elucidar o crime.

Não seria difícil enumerar, de memória, alguns desses crimes que a sociedade civil acredita serem "insolúveis", pelo fato de, na maioria das vezes, a policia não apresentar provas concretas da autoria material ou intelectual, indispensáveis para que os culpados sejam julgados e condenados pela justiça.

O caso típico de crime insolúvel, em Alagoas, e que pode ser um exemplo ilustrativo, é o caso das trinta e duas ossadas encontradas em três cemitérios clandestinos em 1998. Passados mais de quatro anos, depois de muitas idas e vindas, nenhuma ossada foi identificada e nada de concreto foi feito para que fosse resolvido, uma vez que, neste caso, a única técnica capaz de fazer as identificações é o estudo do DNA.

Centenas de parentes de mortos/desaparecidos compareceram ao IML de Maceió, obedecendo à orientação da autoridade responsável pelo problema, preencherem fichas onde foram obtidas algumas informações gerais relativas ao tipo físico, sinais característicos, endereço, etc., informações importantes quando situadas dentro de uma estratégia geral para identificação das ossadas, mas de pouca valia quando tomadas isoladamente.

A ciência, nos últimos anos, deu uma grande contribuição para a resolução de casos relativos a identificação de pessoas desaparecidas: o estudo do DNA. O DNA é a molécula química responsável pela hereditariedade e está presente em todas as células do corpo. Da mesma forma como um código de barras identifica um produto na prateleira do supermercado, o DNA identifica uma pessoa. Cada pessoa possui seu "código de barras" (informação no DNA), que é única e distingue aquela pessoa dentre todas as outras. Pessoas mortas a dezenas, centenas de anos, podem ser identificadas através do DNA obtido de ossos ou dentes.

As trinta e duas ossadas insepultas é um caso representativo para identificação humana de pessoas desaparecidas. Apesar de complexo, do ponto de vista operacional, o mesmo pode ser resolvido, pois não existe nenhum impedimento científico para que as identificações sejam feitas.

A solução do problema passa pela implantação de um Banco de Dados de DNA de Pessoas Desaparecidas. Esse Banco de Dados é um repositório de informações genéticas que torna possível a identificação de pessoas desaparecidas, ou restos mortais, pela comparação com as informações genéticas dos parentes vivos.

Dois tipos de dados serão arquivados: as informações genéticas obtidas a partir do DNA doado pelos parentes de pessoas desaparecidas e as informações genéticas obtidas a partir do DNA extraído de restos mortais (ossos, dentes, etc.). O cruzamento das informações genéticas armazenadas no Banco de Dados permite por em contato as duas pontas do problema: a pessoa ou resto mortal não identificado e a família.

O problema seria atacado simultaneamente em duas frentes, a primeira, com a participação direta da Polícia, Ministério Público, IML, e de Organizações Não Governamentais que trabalham com a defesa e proteção dos direitos humanos. Esse grupo intersetorial desenvolveria trabalho específico em suas áreas de atuação e junto aos supostos parentes das vítimas. Já os parentes seriam, informados dos objetivos do trabalho e se concordarem com o mesmo, doariam amostras de sangue para estudo do DNA. As informações genéticas obtidas dessas pessoas seriam depositadas no Banco de Dados.

A segunda fase seria relativa ao estudo do DNA das ossadas, que necessariamente tem de ser efetuado em laboratório capacitado para este tipo de estudo. As informações genéticas obtidas a partir das ossadas também seriam depositadas no Banco de Dados. A etapa final seria a comparação genética e estatística dos dados obtidos das ossadas com aqueles dos supostos parentes.

A solução proposta acima para identificação de restos mortais não é um exercício teórico, uma vez que esse método vem sendo utilizado mundialmente, com êxito, nas situações em que as técnicas clássicas de identificação falham. Os exemplos se multiplicam em países como Argentina Chile, Colômbia, Bósnia, Eslovênia, Croácia e muitos outros.

Países da Europa, América do Sul e os Estados Unidos, possuem Banco de Dados de DNA de Pessoas Desaparecidas. O Banco de Dados de DNA está tendo papel central, e muitas vezes único, na identificação das vítimas do atentado às torres gêmeas nos Estados Unidos, na identificação das vítimas da guerra na antiga Iugoslávia, na identificação das pessoas mortas pela ditadura no Chile e na identificação das vítimas da guerrilha na Colômbia.

O crime, como a economia, está globalizado. Uma criança pode ser raptada no Brasil e, anos mais tarde, ser encontrada em outro país. Da mesma forma, a facilidade de deslocamento, pessoas podem desaparecer, vítimas de violência ou doenças como o mal de Alzheimer, e outras formas de demência. Estas pessoas, incapazes de se orientarem por conta própria, podem ser localizadas em qualquer parte do mundo. Diante dessa realidade, o Banco de Dados de DNA deve ser estruturado de forma tal que as informações armazenadas possam ser cruzadas com Bancos de Dados de outros países.

A implantação de um Banco de Dados de DNA, ou de forma mais generalizada, das técnicas de identificação humana pelo DNA, aparentemente simples, conforme delineado acima, depende de conhecimentos científicos bastante complexos, principalmente dos resultados mais recentes sobre o sequenciamento do genoma humano. Estes conhecimentos são produzidos em Universidades e Centros de Pesquisa, sendo as tecnologias deles resultantes aplicadas pelas Polícias mais avançadas do mundo.

A Universidade Federal de Alagoas, possui Laboratório de DNA Forense, com domínio completo das técnicas de identificação humana pelo estudo do DNA. Dentre as Universidades brasileiras públicas, somente a UFAL e a UERJ desenvolvem este tipo de trabalho na área forense. O Laboratório é reconhecido, pelo trabalho que realiza, como um dos melhores do Brasil na área de identificação humana pelo DNA utilizando ossos.

Atendendo solicitação da Secretaria de Defesa Social, várias identificações foram realizadas utilizando como material de estudo ossos, tecidos carbonizados, cartilagem etc. O Laboratório tem projetado o nome de Alagoas na área desta ciência, quando atendendo solicitações para identificação de restos mortais e outros casos forenses, dos estados de Sergipe, Rio Grande do Norte, Ceará, Piauí e Pernambuco.

Alagoas tem hoje todas as condições para se destacar nacionalmente como o Estado pioneiro e mais avançado na utilização da ciência no combate ao crime e à impunidade. Para que isto se torne realidade, as relações entre o poder Executivo (Secretaria de Defesa Social), Poder Judiciário, Ministério Público e Universidade Federal de Alagoas devem ser ampliadas e somados esforços para se atingir um objetivo único, que é colocar à disposição da sociedade os mais modernos avanços da ciência forense na área de identificação humana.

Finalizamos com o pensamento do professor José Lorente, coordenador do Projeto Fênix de identificação humana sediado na Universidade de Granada na Espanha: "Nos Estados de Direito, a identificação humana surge basicamente como uma necessidade civil e penal ... Mas, além de uma necessidade legal, a identificação humana, sabe com segurança absoluta quem é cada pessoa ou a que grupo familiar pertence, é uma necessidade social, e mais ainda, humana, a qual não nos podemos furtar".



Fonte: http://www.midiamax.com/view.php?mat_id=476876


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